domingo, 19 de julho de 2015

EM CAMPINAS, SUA VIDA


 




Quando ele veio da cidade de São Paulo para Campinas, não sabia que teria uma vida agitada. Nasceu em uma editora paulistana conceituada, em uma maternidade que lhe deu prestígio. Logo foi desejado por uma livraria no interior de São Paulo, na famosa Campinas, e a partir de então, o endereço de seu novo lar seria na Rua Sacramento. Uma estudante de Letras, que estudava na PUC da Rua Marechal Deodoro, avistou-o um dia e folheando suas interessantes páginas, resolveu levá-lo. Passou a residir em um apartamento situado na Rua Saturnino de Brito. Por bons e saudosos tempos foi o companheiro daquela estudante, aquele que estava com ela toda noite. Que silenciosamente ensinava-lhe muito. Mas, um dia ela viu-se diante de algo inútil em sua vida, já que não podia obter dele nada de novo. Novamente ele residiria em um novo endereço. Ela vendeu-o para um sebo na Rua Barreto Leme. Recebeu uma mixaria em troca, mas pelo menos estava livre daquele velho amigo. A estante onde ele vivia era apertada. Nada parecido com a confortável gaveta rosa de outrora. Sentia-se nestas prisões superlotadas e nascido em uma família nobre, agora era mais um à espera de atenção. O tempo foi passando, suas páginas amarelando, impregnou-se de um cheiro desagradável. Era um velho abandonado, sem perspectivas, esquecido. Certo dia, alguém o percebeu e resolveu levá-lo; era a esperança de novos dias. Mas, ficou pouco tempo na periferia onde seu dono morava. Foi trocado por outro livro, em outro sebo, na Rua César Bierrenbach. Pelo menos, agora seu novo lar era vizinho de uma escola de música, dava para ouvir alguns belos sons. Além do mais, a dona da loja era uma amável senhora que gostava muito de livros. Então, outro leitor desprendido levou-o, mas desta vez, abandonou-e em um terminal de ônibus, em um espaço onde ficavam publicações doadas para que leitores pudessem saborear a gratuita leitura. Sem um lar fixo, ao ar livre naquela Campinas, o destino parecia conduzi-lo para uma destas cooperativas de reciclagem de lixo, pois leitor algum o devolveria àquele lugar. Foi o que aconteceu, quer dizer em parte. Um solitário senhor, também esquecido pelas glórias do passado, um professor aposentado que residia na Rua José de Alencar, decidiu levar aquele livro para sua casa humilde, cheia de conforto. E reservou um lugarzinho em sua estante para aquele novo amigo, junto aos seus velhos amigos de anos de trabalho, de anos de carinho.


CRÔNICAS DE CAMPINAS
ALEXANDRE CAMPANHOLA

Nenhum comentário:

Postar um comentário